Morreram quase metade das colmeias nos Estados Unidos ao longo do último ano e em boa parte da Europa a situação também é preocupante.
Se as abelhas desaparecem, o Homem sobreviverá apenas mais quatro anos”. Esta citação atribuída a Albert Einstein está cada vez mais presente na cabeça dos apicultores norte-americanos, que no último ano voltaram a sofrer uma perda massiva de colmeias, desta vez na ordem dos 44%, bem acima do valor considerado aceitável nos Estados Unidos (até 20%).
A preocupação com o desaparecimento das abelhas estende-se à Europa, com a França a registar em 2015 uma produção de mel de 17 mil toneladas, contra as 32 mil que era habitual conseguir antes de 1995. Além da França, também Bélgica, Inglaterra e os países da Escandinávia apresentam números elevados de mortes nas colónias de abelhas (todos na casa dos 20 ou 30%), mas Portugal surge em contraciclo. Segundo os dados mais recentes do programa EPILOBEE, da Comissão Europeia, entre o outono de 2013 e o verão de 2014 o nosso país registou uma taxa de mortalidade nas colmeias inferior a 10%, a sétima mais baixa entre os 16 países da União Europeia analisados.
“O efetivo nacional passou de 566 mil colónias de abelhas em 2013 para 619 mil em 2015”, adianta Manuel Gonçalves. O presidente da Federação Nacional de Apicultores de Portugal destaca a importância dos mais de 50 milhões de euros investidos no setor através de apoios comunitários, o que impulsionou “a chegada à atividade de um grande número de jovens apicultores”.
Paulo Russo, do departamento de zootecnia da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, reforça esta ideia. “Em Portugal a mortalidade global nunca foi comparável à dos Estados Unidos. Pelo contrário, o efetivo tem vindo a aumentar em parte devido à adesão de um número elevado de jovens com projetos apícolas”.
Por norma, o número de abelhas diminui no inverno e é reposto até ao verão, quando o bom tempo traz mais alimento e a reprodução dispara. O drama nos Estados Unidos é que, no último ano, a taxa de mortalidade na estação mais quente foi idêntica à da estação mais fria.
“É normal haver mortes durante o inverno, mas o facto de os apicultores estarem a perder abelhas no verão é alarmante”, comentou o cientista Dennis van Engelsdorp, que liderou o último estudo nacional realizado na América, em colaboração com o ministério da Agricultura.
A utilização de pesticidas, a contaminação das abelhas pelo ácaro varroa ou o clima são alguns dos múltiplos fatores que podem explicar o fenómeno, subsistindo muitas divergências na comunidade científica sobre o peso de cada um no colapso das colmeias.
As maiores ameaças às abelhas em Portugal
Por cá, Manuel Gonçalves nota “uma maior dificuldade para repor as baixas” ocorridas durante o inverno, mas garante que os dados da Comissão Europeia para Portugal (taxa de mortalidade de 18,1% em 2012-13 e de 9% em 2013-14) “estão em linha com a perceção dos apicultores no terreno”. Ou seja: há anos mais problemáticos do que outros devido à complexidade que envolve a manutenção de uma colmeia.
O professor António Murilhas, do departamento de zootecnia da Universidade de Évora, salienta “o varroa destrutor continua a ser uma dor de cabeça praticamente a nível planetário”, uma vez que não existe um tratamento 100% eficaz contra este ácaro. Ao disseminar parasitas pelas colmeias, obriga o apicultor a manter um controlo apertado para não deixar o problema alastrar-se a ponto de provocar a morte de todas as abelhas.
Outro foco de ameaça é a vespa velutina (ou asiática), que desde 2012 se instalou no norte litoral do país e ataca as abelhas. O combate a esta espécie predadora requer muitas vezes intervenção especializada (para aniquilar os seus ninhos), o que levou a Assembleia da República a aprovar, na semana passada, uma campanha de informação sobre o que fazer quando se detetar um ninho.
“Se algum dia esta vespa estiver presente em todo o país, pode causar prejuízos de 5 milhões de euros no setor apícola”, alerta Manuel Gonçalves.
Já em relação aos pesticidas, “embora presentes”, como assinala Paulo Russo, as suas implicações na morte das abelhas “não estão quantificadas” em Portugal. E entretanto, acrescenta António Murilhas, “surgem novos atores em cena, como o fungo Nosema ceranae”, já identificado em várias colmeias dizimadas nos Estados Unidos e na Europa e que os cientistas suspeitam ter um efeito devastador quando interage com outro agente. Qual? Ninguém sabe ao certo.
Menos dúvidas oferecem as consequências de uma quebra acentuada da quantidade de abelhas no mundo. Sem a polinização pela qual são responsáveis, frutos como a cereja, o melão, a maçã ou o pêssego ficariam em causa, assim como muitos legumes, casos do nabo ou da abóbora. As plantas polinizadas pelas abelhas também poderiam desaparecer e, por conseguinte, os animais que delas se alimentam, interferindo assim em toda a cadeira alimentar. Daí a declaração fatalista de Einstein sobre o futuro da Humanidade sem abelhas.